quinta-feira, 15 de abril de 2010

I have a fucking dream too.

Vida de ateu não é fácil. É até foda. Não ter ninguém pra pedir coisas, tipo ganhar na loteria, não ter nenhum amigo invisível pra se apoiar nas horas difíceis...essas coisas.
Eu sonhei com um mundo sem religião, como um dos Beatles também imaginou, sabe?
Um mundo com doidos se explodindo por que queriam se explodir, não por causa de “um bem maior”. Um mundo onde ninguém diz que Deus só vai honrar seus pedidos se você honrar o pastor com 10% do seu salário e aquelas ofertinhas de fé.
Se Deus existisse isso seria algo pra se pedir.

Aí eu acordei, liguei a TV e vi uma mulher dizendo que fazia sexo com o Diabo, num programa desses onde se toma um copo de água no final pra ajudar a engolir as merdas que se falam nesses programas.

Caí na real: quando eu estiver na minha hora final, perto do fim do abismo, eu não vou ter a paz no coração de saber que o mundo está livre da superstição. E mesmo assim vou ter quer dormir com essa.

Fui ler meus gregos e me sentei com o Obscuro. E o Obscuro (bem ele) me clareou as ideias.

Nos jornais da semana passada se falou muito de um momento histórico: EUA e Rússia assinaram acordos de reduzir mutuamente seus arsenais nucleares. Não dá pra fazer como o Super-Homem fez em um dos seus filmes – jogar todas as ogivas do planeta contra o Sol e acabar com a ameaça da guerra nuclear num estalo.

Mas dá pra fazer como os dois países fizeram: equiparar as forças.

Por mais que a vontade que os ateus e pessoas racionais tenham de tornar crime dizer por aí que Deus está nos vigiando e que, se o que Ele quer não for feito as pessoas vão ver a própria carne derretendo em dor e ranger de dentes pela eternidade – não vai acontecer tão cedo. (mas tá quase lá, já proibiram véus muçulmanos e crucifixos em escolas na Inglaterra, em breve a marca da besta “Ateu: garanta já a sua!”)

O segredo está em buscar o equilíbrio. Ateus e teístas em número e manifestações equivalentes. Que sonho hein? Aqueles que pensam deixarem de ser minoria, só pra variar.
Claro que com a educação no país sofrível, os teístas se expandem mais.
Existem muitos heróis nessa frente da batalha, professores e estudantes que brigam por uma educação melhor, mesmo com o descaso intencional do nosso governo – fica difícil ser populista num país com maioria pensante.
Acho que já é tempo de começar algo como uma manifestação massiva e agressiva, tentando espalhar um pouco de razão por aí.

Guerra declarada e ateus com postura blasé??
“Escreva um livro, oras.”
“Deus não existe. Que as pessoas acreditem no que elas quiserem.”
“O livre pensamento dificulta a reunião de pessoas por qualquer causa.”
Ouvi essas palavras de ateus brasileiros.
Considero isso parte egoísmo, parte passividade.

Por que não ouço nada sobre “Ativismo Ateísta”?
Onde nós estamos? Em bibliotecas, jantarezinhos, barezinhos, fóruns na internet?
FAZENDO O QUÊ, PORRA?!
CONVENCENDO OUTROS ATEUS A NÃO ACREDITAR EM DEUS????
PERGUNTANDO UNS PROS OUTROS QUAL FOI O AUTOR QUE NOS FEZ CÉTICOS???
Os crentes estão lá fora: gritando mentiras, convencendo as pessoas a darem seus salários para pequenos impérios construídos sob o lixo da superstição. Batendo na porta das nossas casas, doutrinando crianças, instituindo o não entendimento, promovendo eventos de milhares, gritando histericamente na TV.

Enquanto isso estamos aqui, murmurando baixinho, trocando esse segredo entre nós mesmos.

NÓS DEVERÍAMOS ESTAR GRITANDO NOSSAS LOUCURAS TAMBÉM!

Tá, desculpe o tom. Mas é isso.
Equiparar forças, jamais vamos afogar aquelas vozes mentirosas de uma vez.

O Obscuro que citei é Heráclito.
Pra ele, harmonia não é quando um lado suprime o outro, nem o fim de conflito, é uma tensão onde nenhum dos elementos jamais chega a vencer definitivamente.
Pra mim é difícil concordar quando ele diz que ambos os lados de um conflito são indispensáveis.
“Eles não entendem como aquilo que está variando consigo mesmo, concorda consigo mesmo. Daí resulta a afinação de tensões opostas, como a do arco e da harpa.”(45)
“A luta é a justiça.”(62)

Se eles são loucos e gritam, temos que gritar junto – e nessa baixaria barulhenta, termos vozes iguais. (mesmo que ninguém entenda porra nenhuma)



[os números entre parêntesis indicam os fragmentos dos textos de Heráclito, segundo a numeração de Bywater]